segunda-feira, 26 de setembro de 2011

No meio do caminho...



Ela soube através de amigos em comum que ele tinha dito, em uma roda de amigos, que ela "era linda". Isto não era comum naquele ambiente de trabalho pesado; mal havia tempo para engolir o almoço, feito geralmente em frente ao computador com o telefone tocando sem parar. Ela, que nunca tinha olhado o moço, começou a reparar melhor. Ele era até que bonito. Não era seu tipo mas, vá lá, sozinha há tanto tempo... todos diziam para ela se permitir, vai ver esta era a oportunidade. Os "bom dia" passaram a ser acompanhados de sorrisos, cada vez mais abertos e menos discretos. Os almoços passaram a ser feitos lado a lado. O cafezinho sagrado do dia era tomado ao lado dele. Pessoas de outros departamentos começaram a reparar a intimidade entre eles crescendo, os toques cada vez menos sutis e os olhares...

Só que ele não tomava a iniciativa. Nem ela. Aliás, para ela era complicado se envolver com alguém do trabalho, já que as experiências anteriores mostravam que sim-tudo-vai-dar-errado-e-você-vai-se-sentir-péssima. Ela era gata escaldada. Mas e todo mundo dizendo na cabeça VOCÊ NÃO SE PERMITE? Ela se permitiu, e um dia perguntou porque ele não a chamava para sair. Ele disse que mais tarde ligava.

Ele ligou. Aliás, mandou uma mensagem dizendo que ele gostaria de "dar um rolé." Primeiro alarme ali já soou: ela não era mulher de rolés. Nunca fora. Mas vá lá, ele tem seus 28 anos, às vezes é hábito de fala. (Como acreditamos sempre no que queremos acreditar, não é mesmo?). Ela estava no banho e respondeu com "rsrsrs".  Ele ligou em seguida.

E ai, o que vamos fazer? Bom, você é quem sabe. Ah, não queria te atrapalhar. Caso você já esteja ocupada hoje, um amigo meu me chamou para ir com ele assistir ao campeonato de luta-livre que está tendo em Santos. Olha, eu consegui ingressos gratuitos (mentira, ela tinha comprado) para assistir ao Cirque du Soleil. Vamos? Circo do que? Não, não curto estas coisas.

Vários sinais foram dados, mas novamente cada um ouve o que quer. Mesmo com o sinal de PERIGO piscando e gritando na cabeça dela, ela disse: vamos então ao cinema. Que tal? Você escolhe o filme! Ele responde: combinado então. Mas... aí, eu te pego no meio do caminho, você deixa o carro no metrô e vem de metrô, você vai de táxi, como fazemos?

Ai ela já soube: tudo daria errado. Não pelas várias dicas que ela tinha se recusado a ver. Carência é uma merda mesmo. Mas vamos lá. Eles foram ao cinema, o filme ela não se lembra. Lá ele tentou, como deve fazer com todas as menininhas com quem ele sai, se aproximar dela, beijá-la. Ali mesmo ela explodiu: levantou-se e disse, mais alto do que deveria, TE ESPERO LÁ FORA! Ele assistiu o filme, até o final.

Ao vê-lo ela disse tudo. Que não era mulher de rolé, que tinha se sentido desprestigiada. Que ele deveria estar acostumado com meninas e o charme dele garantia tudo, mas ela não era mais menina. Acabou de falar aliviada, vermelha, chorando. Ali ela viu: era carente, se sentira desrespeitada e ela se descobriu, ali, mulher. Ali a ficha caiu. Ali ela soube.

Beijou-o no rosto e foi embora, sem olhar para trás. Aliviou a alma ali. No trabalho continuam como se nada tivesse acontecido, até com as mesmas brincadeiras. Todas as noites ela agradece por ele ter entrado na sua vida. Todas as noites ele se pergunta: onde foi que eu errei?

 

2 comentários:

  1. Bem diz o ditado: "onde se ganha o pao, nao se come a carne"... Adorei! Bjs!

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  2. te digo que é uma estória verídica livremente adaptada... beijos!

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